terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Razões para divagar entre os livros

I
Há pouca razão, geralmente, numa deambulação literária, mas arrisco enunciar boas razões para a incursão numa. Roland Barthes disse n’O Prazer do Texto, que este, o prazer do texto, era o momento em que o seu corpo seguia as suas próprias ideias, pois este não tinha ideias coincidentes às dele. Também o meu corpo não é totalmente regido pelo que dita a minha consciência, no que tenho de mais racional. De mais – isolada, ilusória, verdadeiramente – eu.
Das palavras (quando, na inteireza do que expressam, assumem o seu carácter orgânico) releva um misto de perturbação e de prazer. Uma leitura opera em sentidos diversos, implicando sempre que se tome posição – quer seja de repulsa, de indiferença, ou de admiração. As emoções, das que nos desperta um texto, carregam traços do que, de tão quase visceral, é tão obscuramente vida.
Daí que me seja tão perversa a existência de uma enorme quantidade de livros que jamais poderei ler (ainda que vivesse para lá da mais ousada velhice), que me corroa a presença de alguns intrusos que se fazem passar por eles, que me fascine e tumultue ver, numa parte deles, mesmo que ínfima, transcrito o que de mais íntimo sustenta o meu ser por inteiro.
E por haver palavras, frases impressas na imensurabilidade das folhas, cujo dom é o da alteração do espírito dos homens, se renova, a cada dia, o que é diante de nós exposto, a fim de conquistar-nos. A exigência cresce de forma proporcional ao desenvolvimento – cabe a nós decidir. Por isso, divago interminavelmente entre os livros, esperando, ávida, por um momento em que me abandono ao que, fora e dentro de mim, neles explode.
Natália Reis

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